quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Multiplos Olhares

TODOS OS BICHOS DE NÊ SANT'ANNA

“ATÉ O CHICO ENTROU NA RODA”
Começou o julgamento do mensalão. No primeiro dia a acusação citou versos de Chico Buarque nos quais ele elegantemente fala que a “nossa Pátria mãe gentil era subtraída”. Como roda mundo, roda pião, os advogados de defesa não se esquivaram do dever de casa e no segundo dia de julgamento, uns mais, outros menos, mostraram talentos retóricos memoráveis ao retrucar as acusações: “Ora, o que importa é a Constituição, não versos do Chico, não há provas que houve mensalão, só frases de efeito”; “Meu cliente é inocente, se por acaso (por injustiça, é claro), ele for condenado, que a pena seja abrandada” (trocando em miúdos: não deve ser o único bode expiatório midiático); “Não se furta a responder pelo que fez... caixa 2... é ilícito? É!!!”; “Não deve ser condenado pelo CNPJ, mas julgado pelo CPF E RG”; “...No máximo um caixa 2...” (mais uma vez trocando em miúdos: foi só um caixa 2, ora, que hipocrisia é essa, todos não faziam uso desse expediente?)
Tudo muito polido e elegante, não como uma “ópera do malandro”, mas, sem dúvida uma ópera! Os que quiserem assisti-la são obrigados a vestirem-se de acordo, é necessário à encenação e a nossa auto-estima, pois como já cantou Chico: “quem brinca de princesa, acostuma-se a fantasia”.
E por que não fazer de conta se somos multifacetados e tateando em busca de uma identidade “respeitável” buscamos classe, seriedade, austeridade, formalidade...embora, na maioria das vezes, quando encontramos esses elementos personificados, logo acusamos a criatura que os porta de não ser do povo, ter o nariz empinado, não saber negociar, não ter jogo de cintura, etc.,etc. e tal.
A ópera, até agora, está “fina”, advogados e réus estão incorporando e encenando seus papéis com estudada sutileza; nada é escancarado ou gratuito: palavras ferinas, adjetivos ácidos ou bajulatórios e princípios legais são cuidadosamente escolhidos.
A platéia da nossa Pátria mãe gentil amadureceu? Perdeu a inocência, claro, não acredita mais em “incorruptíveis” ou retratos em branco e preto e também não quer perder o espetáculo que passa na avenida! Mas, sem dúvida, veste uma fantasia “chique”! Lembram-se do tragicômico impeachment do Collor? Que horror, quanta falta de polidez, que encenação de mau gosto!
A ópera do mensalão ficará em cartaz por várias semanas, mas o verso do Chico que se encaixa como uma luva em seus atos não seria “não existe pecado do lado de baixo do Equador?”

Nota: usei com licença poética alguns versos de Chico Buarque, em negrito. Ele entrou na “roda dessa ópera” pelo seu imenso talento e posturas éticas, ao contrário dos canastrões atores principais.

POETA BRINCANTE
Sou um poeta brincante
E não levo a sério
Nem a vida,
Nem a morte.

Recolho versos do vento
E não traço retas:
Componho mosaicos,
Em minha caminhada no tempo.

Um comentário:

  1. MUITO INTERESSANTE ESSE TEXTO, POIS FALA DA NOSSA REALIDADE.

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